Por: Alex Valério
Tem dias que a gente parece apenas estar vivo. A vida parece seguir seu ritmo normal: seu coração bombeia o sangue que irá passear pelo seu corpo e você se mantém de pé por conta disso e das milhões sinapses que seu cérebro faz para te manter de pé. Algumas vezes parece que nada faz muito sentido, então nós seguimos em frente, sem saber muito bem para onde e nem o porquê, nós apenas vamos indo.
A vida não deveria ser algo complicado ou difícil de acontecer. Poderia ser simples e leve. Algo como aquelas paisagens de praia que nós vemos como plano de fundo de celulares e computadores. Às vezes nos julgamos livres, mas a realidade é que somos reféns de um sistema injusto, capitalista e cruel. Lutamos pelo direito de ir e vir, mas não brigamos pela liberdade de ser aquilo que gostaríamos de ser, nós simplesmente aceitamos aquilo que nos disseram que era certo. Infelizmente nos restaram poucos prazeres nesta vida. Sim, poucos! Considerando que nós temos de trabalhar incansavelmente para “ser alguém com chances de futuro”, quase não sobra espaço para outras coisas. Muitas universidades e empresas se assemelham a campos de concentração, porém praticam o tipo de tortura que é permitida pela constituição.
A internet nos aproxima de tudo, nos deixa próximo de todos, mas ainda assim nos sentimos vazios, estamos sempre em busca de algo que não sabemos o que é e, assustadoramente, estamos adoecendo cada vez mais. Dia destes, me pediram para rir mais baixo. O pedido foi tão chocante aos meus ouvidos que eu estou perplexo até agora. O mais espantador não foi isso, mas o quanto as pessoas vem me pedindo isso há tanto tempo. Nunca assim, tão diretamente, mas tenho tantos amigos que tapam a minha boca ou que ficam envergonhados quando outras pessoas começam a nos encarar, por conta do volume da minha risada. É como se o mundo, de algum jeito, viesse me pedindo há algum tempo: não ria assim, você chama atenção demais e isso não é bom.
Rir é um dos poucos prazeres simples e honestos que me restaram. É algo que simplesmente acontece e que, na maior parte das vezes, faz eu não me importar com o que os outros vão pensar. Fico triste ao constatar que muitas vezes me esforcei para me tornar uma pessoa mais séria, lamento todas as minhas tentativas de educar o meu riso, de segurar o barulho de porco que sai das minhas narinas quando algo é muito engraçado.
Não me orgulho da quantidade de vezes em que tapei a boca para abafar o som da minha gargalhada. Eu quero rir, quero falar, quero viver. Quero arrancar as mordaças que me calam a boca, tirar as vendas que me tapam os olhos. Quero poder olhar para mim livremente. Quero poder gostar de mim e aceitar todas as minhas partes que são diferentes das partes das outras pessoas. Ser diferente não me faz pior ou melhor que alguém. Quero aprender a aceitar que posso gostar de mim. E, se eu posso, talvez outras pessoas também poderão gostar de mim. Quero ser eu, sem deixar de considerar os outros, mas sem me deixar controlar por estes outros. Vou fazer um trato com a minha loucura: o do não-trato!
Não me mande não rir baixo, me mande ser feliz.
Imagem capa: Pexels
Colunista:
Alex Valério
CRP: 06/134435
Alex Valério é Especialista em Terapia Comportamental pela Universidade de São Paulo (USP). Psicólogo pela Universidade Nove de Julho. É redator no Portal Comporte-se, colunista no Psicologia Acessível e, também, escreve para o próprio blog. Realiza atendimento clínico para adolescentes, adultos e casais. Está localizado na Avenida Paulista, em São Paulo. Possui interesse em poesia, literatura, crônica, cinema, música e tecnologia.
Contato:
facebook.com/ominutoterapia
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