Por: Maria Aline Moreira de Oliveira Constantino
Entende-se inteligência como um processo que se inicia desde o nascimento da criança e se desenvolve ao longo da vida, dependendo da quantidade e qualidade dos estímulos oferecidos pelo ambiente, da fisiologia de suas estruturas cognitivas, além da influência dos valores culturais ao qual esse sujeito está inserido. Podemos dizer que a inteligência nasce à medida que começamos a agir e interagir com e sobre o mundo e quando participamos ativamente do processo de aprendizagem, ou seja, quando somos conduzidos a construir e não a reproduzir ou repetir mecanicamente um processo.
Nesse ponto, pode-se inserir a discussão sobre as variações que ocorrem nos sujeitos com altas habilidades/superdotação, desde que iniciam suas aprendizagens. Partindo-se dos ideais de Jean Piaget (1896-1980), que embora não tenha desenvolvido pesquisas, nem se dedicado ao estudo do funcionamento cognitivo de pessoas com Altas Habilidades/Superdotação, muito contribuiu para a compreensão de fenômenos pertinentes ao desenvolvimento da inteligência. Com base nos conceitos de Piaget, admite-se que o processo que leva à evolução de um estágio de desenvolvimento para o seguinte é o mesmo para todos os indivíduos e o que vai produzir diferenças entre um dito “normal” e outro considerado “superdotado” e até entre “superdotados” é o modo e o ritmo como as estruturas cognitivas se organizam nas tentativas de entender o mundo e se adaptar a ele.
O conceito de altas habilidades tem mudado ao longo do tempo. Atualmente o termo superdotação, também muito utilizado, está além do que os testes de inteligência podem mensurar. Por vezes, há possibilidade de considerar como portadores de altas habilidades, apenas os alunos que apresentam uma capacidade intelectual superior, excluindo aqueles que possuem talentos em outras áreas, tais como: a psicomotora (com ótimo desempenho em esportes) ou artísticas (com talento para se expressar através da música, pintura e poesia).
Contudo, deve-se compreender que apesar de adquirirem vantagens na área cognitiva e na capacidade de rendimento psicomotor, os superdotados podem encontrar dificuldades psicossociais. Assim, entende-se que a escola e o professor que não estejam preparados e habilitados para lidarem de maneira empática com as demandas apresentadas pelos alunos portadores de altas habilidades, podem impedir o desenvolvimento destes.
No campo educacional há um imaginário social de que altas habilidades/superdotação poderia se manifestar em diferentes áreas do conhecimento, mesmo sem oportunidades escolares adequadas. A concepção atual de identificação de alunos com altas habilidades/superdotação rompe com esse paradigma. No caso de altas habilidades/superdotação, assume especial importância o contexto no qual se dá a aprendizagem, uma vez que este pode ser um fator facilitador ou cerceador das manifestações de potencialidades e talentos. Conforme o valor dado pelo contexto, o sujeito pode se motivar ou não a apresentar suas habilidades e mesmo que se perceba talentoso em alguma área, não se dedicar como poderia, caso esta não seja estimulada ou valorizada socialmente.
Howard Gardner, psicólogo e pesquisador norte-americano, revolucionou o campo da psicologia cognitiva ao identificar em sua obra Estruturas da Mente: As Teorias das Inteligências Múltiplas, diversos tipos de inteligências distintas. Sua pesquisa ultrapassa a noção comum e tradicional de inteligência como mera capacidade cognitiva uniforme, para a definição de inteligência como “capacidade de resolver problemas ou de criar produtos que sejam valorizados dentro de um ou mais cenários culturais” (Gardner, 1994, p.46).
Gardner (1994) reconhece a inteligência como um conjunto de capacidades, talentos e habilidades mentais, afirmando que todo ser humano possui múltiplos tipos de inteligência e cada um deles pode ser desenvolvido ou enfraquecido. Em seus estudos, identificou nove tipos de inteligência: verbal ou linguística, lógico-matemática, musical, espacial, corporal ou sinestésica, interpessoal, intrapessoal, naturalista e existencialista, trazendo uma nova perspectiva acerca da relação entre as altas habilidades/superdotação e a inteligência, considerando que a primeira resulta não somente do nível de inteligência, mas do perfil dessa interação com o mundo, uma vez que essa inteligência surge da combinação da herança genética, condições de vida, cultura e época ao qual o sujeito está inserido.
Joseph Renzulli é um psicólogo educacional norte-americano conhecido por contribuir para o desenvolvimento do talento das crianças na escola e para a compreensão da superdotação. Segundo ele, a superdotação seria influenciada pela confluência de três fatores: Capacidade acima da média, motivação ou comprometimento com a tarefa e Criatividade. De acordo com sua teoria, esses fatores atuam através de um suporte basilar que envolve família, amigos e escola, destacando, assim, a importância dos aspectos sociais para manifestação e sustentação plena da superdotação.
A capacidade de compreender empaticamente o aluno, ou seja, compreendê-lo a partir do seu quadro de referência interno, permite não só o desenvolvimento intelectual do aluno, como também o seu crescimento enquanto pessoa, promovendo, assim, uma aprendizagem significativa.
Falando em capacidade empática, não podemos deixar de citar Carl Rogers (1902-1987), eminente psicólogo americano, considera a empatia uma das atitudes fundamentais e necessárias para a criação de um ambiente propício ao desenvolvimento. Em seus escritos sobre educação, afirma que o aluno possui motivações e entusiasmos, próprios, que devem ser liberados e favorecidos pelos professores e apresentou um modelo educativo onde, nessa relação pedagógica, o centro das atenções era a pessoa do aluno e o professor era um facilitador do processo de aprendizagem.
Quando fala-se em ensino, pode-se dizer que ensinar não é apenas comunicar um conhecimento, assim como aprender não é apenas aprender esses conhecimentos vinculados, pois nada disso gera uma influência significativa sobre o comportamento.
Aprender é um processo dinâmico, que exige concentração, interesse, empenho e motivação e por tal razão é importante que as relações de cooperação e participação entre professor e aluno estejam presentes. A verdadeira aprendizagem é autodescoberta. Uma aprendizagem em que há apropriação e assimilação pessoal, que se incorpora na nossa própria experiência o que se aprendeu e se descobriu, tem impacto sobre nosso comportamento e leva a mudanças e melhorias.
A valorização social do conhecimento interfere na construção da inteligência, podendo direcionar essa construção para determinados tipos de conhecimento por agregar significados ao que o sujeito sente, percebe, pensa ou realiza. Os valores culturais do contexto e do momento histórico, podem gerar motivação à aprendizagem, funcionando como um estímulo a mais ao desenvolvimento de certas potencialidades humanas, assim como podem dificultar o aparecimento de aptidões que o sujeito tem, mas, por falta de estímulo, não manifesta. Isso vale tanto para pessoas com altas habilidades/superdotação como para aquelas ditas “normais”.
Há que se retomar aqui a lembrança de que cada indivíduo é particular, seja em suas características, interesses ou expressões. Assim, embora haja aquelas características que são compartilhadas por grande parte das pessoas dotadas de altas habilidades/superdotação, existem outras peculiares e específicas que devem ser estudadas de forma individual. O que o professor precisa é identificar as habilidades e competências apresentadas pelos alunos e utilizar o máximo de seu potencial para um desenvolvimento construtivo e enriquecedor enquanto pessoa a ser social.
“Por aprendizagem significativa, entendo, aquilo que provoca profunda modificação no indivíduo. Ela é penetrante, e não se limita a um aumento de conhecimento, mas abrange todas as parcelas de sua existência.” (Carl Rogers)
Referências:
GARDNER, Howard. Estruturas da mente: a Teoria das Inteligências Múltiplas. Porto Alegre: Artes Médicas, 1994. Publicado originalmente em inglês com o título: The framsof the mind: the Theory of Multiple Intelligences, em 1983.
PIAGET, J. Psicologia da Inteligência. Rio de Janeiro: Editora Fundo de Cultura, 1956.
RENZULLI, J. S. O que é essa coisa chamada superdotação e como a desenvolvemos? Retrospectiva de vinte cinco anos. Revista Educação. Porto Alegre, ano 27, n.1, jan/abr 2004. pp. 75-134. Publicado originalmente em inglês com o título: What is this thing called giftedness, and how do we develop it? A twenty-five year perspective. Journal for the Education of the Gifted, v. 23, n. 1, p. 3 – 54, 1999.
ROGERS, Carl. Liberdade de aprender. 2ª ed. Belo Horizonte: Interlivros, 1973.
Imagem capa: Pexels
Colunista:
Maria Aline Moreira de Oliveira Constantino
CRP 05/54266
Psicóloga Clínica Humanista Centrada na Pessoa
Licenciada em Ciências Biológicas
Psicopedagoga
Atuo na cidade do Rio de Janeiro – RJ
Contatos:
Página: facebook.com/PsicologaMariaAline
Email: mariaaline.psi@gmail.com
Telefone: +55 21 991064777
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